“Simpatia demais é perigo” eu pensei, mas como na hora do
recreio ninguém entra pra sala enquanto o sinal não toca, não dei importância,
e segui no contra-fluxo do pensamento. Faz parte, talvez, do encanto de beber água
na cuia lá no riacho da consolação. Ri como um besta no trecho de A Origem das Espécies, do
filósofo-naturalista – se assim me permitem adjetivá-lo – C. Darwin: “(...) que
ninguém se admire com o fato de ainda existirem pontos obscuros relacionados à origem
das espécies e às variedades, desde que forneça o devido desconto à nossa
profunda ignorância relativa às inter-relações entre todos os seres vivos
(...)”. Imagino agora a cara lavada de Darwin enquanto escrevia isso, e fico
rindo até às três da manhã enquanto procuro de volta o caminho da razão.
Um samba chato sobre o amor e seu trabalho silencioso
penetrou minha cabeça: “deve ser do vizinho”, fui até a varanda do apartamento,
enfiei a cabeça pra fora da sacada, mirei em cima, em baixo, dos lados...
“silêncio total”. Me dei conta que veio mesmo de minha cabeça, fucei o relógio,
eram quatro da manhã, fumei o último cigarro da carteira, coloquei o
despertador para às sete horas, não não... para às sete e quinze – vou
compensar esses quinze minutos fazendo a barba e escovando os dentes enquanto
tomo banho. De nada adiantou, não dormi. Quando pensei que ia debruçar nos
sonhos, baixo a guarda, e desprevenido que estava, Joana do Arco me pega nos
pensamentos. Levantei, fiz um café forte para ver se compensava um pouco a
ausência da nicotina pelo menos até o dia clarear.
Durante toda semana Joana do Arco não saiu da minha cabeça,
perdi alguns contratos por não dar importância aos prazos, um prejuízo que dói.
“No domingo vou levantar bem cedinho, ligar pra Joana do Arco e encontrá-la na
praia do Saco”. Assim o fiz.
O sol estava terrível como sempre, peneirando o céu e
infiltrando aqueles raios por todos os lados, “por que não combinei pela
tardezinha ou pela noite?” Recebi a ligação dela: “Jorgin, venha cá, estou na
Ponta do Saco”. Demorei um pouco, mas cheguei e nada, nem ninguém estava lá.
“Jorgin, corra, estou na Ilha da Sogra”. Esperei o catamarã e fui. Tinham uns
turistas, alguns gringos e uns baianos efusivos, mas nada de Joana do Arco.
“Jorgin, estou no mar em frente ao Bar do Bitão”. Como um cego me direcionei
até lá apalpando o vento, e pra variar, ela não estava onde disse. Me invoquei
e fui pegar o celular para, de uma vez todas, desistir do (des)encontro, enfie
a mão no bolso e não achei nada. Ora, eu não tinha um celular.
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