sexta-feira, 1 de junho de 2012

A Saudade Que Arranha

“Quando bate aquela saudade, é porque a coisa está ruim”.



Com esse pensamento Ribamar Franco encerra a vida útil desta quinta-feira. Um dia pálido, só trabalho, com a cartela sagrada de Sominex vazia, sem paciência, sem um livro, sem cigarro, sem cerveja e agora, sem juízo. Deitou e levantou vinte e sete vezes antes de lembrar que não havia tomado banho. Despiu-se, contou os sinais do corpo para ter certeza de que todos ainda estavam em seu devido lugar e verificou a temperatura da água com o braço direito, sem certeza ainda que encararia o frio dessa noite de inverno.

A virilidade perdeu faz tempo, mas lembra com cautela da sua primeira noite de amor. Joana, o nome dela, um ser gentil, despenteado e confuso. Sempre que recorda dela faz questão de olhar para o chão e procurar sua sombra magra, que foi o vórtice central de todas as ambições, sobretudo as do lado da coragem. Já foi caçador de alma penada, já fez nó em muita ripa envergada, já torturou filhote de onça, e hoje, até da água gelada tem medo.


A sexta feira foi igual ao dia anterior. Depois de deitar e levantar vinte e sete vezes, depois de contar os sinais do corpo e decidir tomar banho, girou a torneira e com hostilidade entrou na água sem fazer careta para o frio que escorria pela espinha. Sorriu e quase chorou, só não caiu a gota porque o sal depositado de tanto tempo sem umidade tornou-se crosta, vestiu-se, deitou o retrato da falecida esposa e foi procurar Joana.

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